sexta-feira, 18 de novembro de 2016

Nocturnal Animals (2016) de Tom Ford


O segundo filme do estilista barra realizador Tom Ford, depois de A Single Man (Um Homem Simples, 2009), abre com umas senhoras nuas, muito gordas, a agitar as banhas em slow motion. Perante tal imagem-ilha de poder visual instala-se desde cedo a dúvida: show ou bizarria amestrada? Estas imagens correspondem narrativamente a uma das criações da protagonista, a artista contemporânea, Susan (Amy Adams, a ruiva principal num filme onde tudo tem a qualidade do vermelho glamour, mesmo o sangue é glamoroso), que recebe do ex-marido (Jake Gyllenhaal, escritor em modo sensível) um romance prestes a publicar com o título Nocturnal Animals(Animais Nocturnos, 2016). O livro esconde um thriller de violação no Texas (no qual Jake tem o seu segundo papel, o de homem desesperado) e fará a protagonista recordar e reavaliar o seu passado, nomeadamente a forma como trocou o ex-marido pelo actual engatatão.
Tal como acontecia com Colin Firth no filme de 2009, também aqui se revela o tema predilecto de Tom Ford: o do poder de sucção do passado, a incapacidade de sair dele. Mas gostava de voltar à questão das gordas por um motivo. Se ela tem uma justificação (ainda que frágil) no universo narrativo (é um índice do maravilhoso e horripilante mundo dos óculos de massa, bebidas extravagantes e poder, na actual high art novaiorquina), ainda mais o tem como prova de um gosto pela criação estilística, pela composição da imagem bela ou provocadora. Tal faz com que a adaptação do romance de Austin Wright, juntamente com o uso pesado da música de Abel Korzeniowski, submeta o filme a uma rigidez de pensamento: a literatura, e com ela o thriller, funciona como uma antecâmara, um eco distorcido do cinema, e com ele do drama. Tudo se submete, ditatorialmente (elipses, representação, montagem), a esta ideia de paralelismo, sob pena de cada mundo não ter a espessura suficiente além do que se quer provar. Dito isto, Michael Shannon, enquanto xerife do interior americano, canceroso [numa personagem dos já longínquos universos de Blood Simple (1984) dos irmãos Coen], ergue-se como única substância viva além do traço comparativo.

Sem comentários:

Enviar um comentário